quinta-feira, 11 de março de 2010

A quarta-feira no futebol



Champions League lá e cá, alívios e preocupações de Dunga e um jogo para a história da Copa do Brasil



Além da torcida do Manchester United, que se regalou ontem no Old Trafford com o sonoro 4 a 0 sobre o Milan, desconfio que mais alguém tem motivos de sobra para festejar a eliminação dos italianos da Champions League: Dunga. Se pairava no ar mais alguma dúvida a respeito da convocação de Ronaldinho Gaúcho para a Copa, ontem essa dúvida foi dissipada.

Mais uma vez, Gaúcho se escondeu em campo. Com a camisa do Milan, mostrou que não é jogador de decisão. Agora Dunga pode falar , “vocês estão vendo?”. Desconfio que ele deve ter um breve refresco da opinião pública e da imprensa corneteira de plantão, obstinada na campanha pelo jogador na Copa. Onde quer que se fale em seleção, o assunto é o Gaúcho. Ninguém se conforma com Elano, Júlio Baptista e Josué. Querem craques. Querem o futebol vistoso da seleça de 70, de 82. Mas os tempos são outros. Na era do futebol-força, do futebol coletivo, Ronaldinho ficou obsoleto. É uma grande pena.

Os outros brasileiros que estão correndo o risco de “bailarem” após a rodada de ontem da Champions são Kaká e o técnico “brasiliano” Leonardo, do próprio Milan, que errou ao escalar Ambrosini improvisado na zaga e começar o jogo com Beckham no banco. Justo ele, que conhece todos os atalhos daquele gramado, tem experiência em Champions, estava mais do que motivado para jogar contra seu ex-time e, quando entrou, deu o chute mais perigoso do Milan contra a meta de Van der Sar. Agora, aliviando um pouco pro Leonardo: time que tem um goleiro com Abbiati não dá para querer muito mais que isso.

Já Kaká saiu vaiado pela torcida no Santiago Bernabeo, quando foi substituído para dar lugar ao xodózinho dos madrilenhos, Raul. Como explicar o sono dos galáticos no segundo tempo, eliminados em casa pelo limitadíssimo Lyon, da França. Vem aí crise brava no time merengue. Se a torcida já estava pegando no pé de Kaká, achando que ele não se aplica o suficiente em campo, agora deve querer a cabeça do brasileiro. Alguém tem que levar a culpa, ser o Judas da derrota de ontem. E Kaká deve ser esse Judas. Quem diria.

Na Champions League latina, também conhecida como Libertadores da América, o salvador do Corinthians no jogo de ontem contra o Independiente, da Colômbia, foi Dentinho. Apesar de todas as contratações da diretoria para a temporada 2010, quem está fazendo milagre no Parque São Jorge é o santo de casa mesmo. Dentinho: A cara do Timão. Mano Menezes, que já tentou zil formações diferentes na linha de frente do time, tem que entender o Corinthians deve ser Dentinho, Dentão e mais 9.

Em Santos, o que dizer dos 10 a 0 do time da Vila contra o Naviraiense pela Copa do Brasil? Alguns podem ter ficado com pena do time do Mato Grosso do Sul. Por outro lado, imagine as histórias que esses jogadores terão para contar para seus netos? Daqui a 10, 20, 30 anos, quando alguém mencionar o Naviraiense, logo vão lembrar: “Ah, é aquele time que perdeu de 10 pro Santos de Robinho, Neymar e Ganso”. Assim como o Tiradentes, doPiauí, que tomou 10 do time da Democracia Corintiana, ou o Botafogo da Paraíba, que tomou 10 de Kaká e França no Morumbi. Não são só os meninos da Vila que entram para a história. Os jogadores do Naviraiense também tem um motivo para serem lembrados nos arquivos do futebol brasileiro.

Para fechar o boletim futebolístico, que farra essa do Adriano, hein? Após o barraco armado pela mulher na entrada de um baile funk na favela da Chatuba, do vice presidente do Flamengo vir a público declarar que o jogador tem problemas com o álcool, da mídia futebolística se alarmar com a possibilidade do disciplinador Dunga cortá-lo às vésperas da Copa, eis a novidade: nada vai acontecer!

Dia desses, para tentar minimizar o estrago, o médico da seleção e do Flamengo, José Luiz Runco, deu uma declaração na linha “se as pessoas forem se preocupar com o consumo de bebidas alcoólicas por parte dos jogadores, é melhor acabar com o futebol brasileiro”. E o presidente da CBF, Ricardo Teixeira, então? Ele falou que não tem problema algum o jogador de futebol beber cerveja, “o que não pode é beber o engradado”. Que piada, né? Já que não interessa para ninguém o corte do Imperador da seleção, rola a operação "Abafa o caso". No Brasil, jogador é tratado quem nem criança mimada. Se faz birra, em vez de tomar punição, vai para Búzios descansar a cabeça.

Mas eu garanto que tem pelo menos uma pessoa que ficou bem preocupada com essa história e com a possível influência baladeira que o Imperador pode ter sobre os demais jogadores do grupo que vai à África do Sul. Você tem uma chance para advinhar quem é.

sexta-feira, 23 de outubro de 2009

Favas contadas


A volta do tucanato ao Planalto é só uma questão de tempo. Serra já está com os dois pés lá. Mesmo assim, a corrida presidencial no ano que vem deve reservar algumas peculiaridades e mostrar como funciona a lógica da agenda política dos grupos que se revezam no poder.


A vitória de José Serra na corrida presidencial do ano que vem são favas contadas. A imprensa já sabe, os tucanos já sabem, o PT já sabe. São as regras do jogo. Enquanto os brasileiros mais uma vez fingirão exercer a plena democracia, comparecendo às urnas em 2010, vale a pena alertar que os caciques dessa história já decidiram há muito a agenda política do país para os próximos anos.

Entre Dilma, Ciro e Marina, a petista deve ser escolhida para medir forças com o tucano no segundo turno. Por que ela? Porque representaria, em tese, a continuidade do governo “Lula Paz e Amor”. Mas todos sabem que ela não tem a menor chance. O PT sabe. Por isso, justamente, escolheu a “mãe do PAC” como sua canditada. Ela será o boi de piranha, o voto vencido nessa lógica de revezamento no poder, polarizado desde os início dos anos 90 entre PT e PSDB - uma versão pós-moderna da política do Café com Leite.

Se todos sabem que Dilma não chegará ao Planalto em 2010, por que o partido a escolheu? Primeiro: porque quase todos os outros tubarões que poderiam figurar nessa corrida foram envolvidos em escândalos (José Dirceu, Antônio Palocci). Segundo: já que o PT sabe que chegou a vez de Serra, que não terá chances no ano que vem, melhor queimar seu cartucho com um candidato sem passado político, marinheiro de primeira viagem. Dilma será o sparring de Serra.

Mas, para chegar até o segundo turno, Dilma travará uma boa briga com Marina. Segundo escreveu André Forastieri em seu brilhante blog, Marina é o nosso Obama. A candidata que poderia representar a mudança para um modelo de política, digamos, mais progressista, humanista, popular, inclusiva. Marina é hoje a “esquerda da esquerda” (muitas aspas nessa hora). É uma das poucas que não topou vender suas convicções em troca da permanência na máquina do governo. Pauta-se pela coerência, pela ética. Será a oposição de quem sempre se acostumou a ser oposição. Justamente por isso, deve levar uma boa parcela dos votos que iriam para Dilma. Deve angariar grande parte do eleitorado que se sentiu traído pelos desvios que o PT e o presidente “precisaram” realizar para se manter no poder. Os votos da comunidade evangélica também são delas.

Ainda tem o Ciro, candidato aguerrido. Eleição após eleição, vai demarcando o território, sedimentando seu espaço, seu nome, sua marca. É o marido da Patrícia Pillar. Esteve ao lado da atriz em sua luta pelo câncer. O povo conhece a história. É um canditato com apelo, tem carisma e garra para brigar. Pode ser uma alternativa para aquela fatia da classe média que não gosta do José Serra e tem horror a tudo que representam as mulheres da “esquerda” (sempre as aspas) - sem mencionar Heloísa Helena, que também é boa de briga.

Mas, decididamente, chegou a vez de José Serra. O desafio é saber como o país e a comunidade internacional irão reagir a essa troca de figuras. Poucas vezes o Brasil esteve tão presente na pauta mundial. É o país da moda. Os principais estadistas do planeta se acostumaram a reverenciar o carisma e a liderança de Lula. É o homem da vez, a voz da América Latina e de um país com ganas de ingressar no bloco dos países desenvolvidos para não mais sair. É o homem que pode aplacar o fogo revolucionário de Hugo Chávez.

Com o Serra vai se portar? Será que ele terá a mesma sorte, presença de espírito, eloquência, carisma, jogo cintura, marketing pessoal e malandragem de Lula?

Dificilmente algum político terá, no curto prazo, a mesma aprovação e simpatia no Brasil e no mundo. Principalmente com a proximidade da Copa de 2014 e das Olimpíadas de 2016, o país nos próximos anos deve viver como nunca a ilusão ufanista de que “chegou a sua vez”. Seria mesmo o Brasil o país do futuro? Lula soube, como poucos, conduzir essa ilusão, essa utopia. Soube convencer o Comitê Olímpico Internacional que o Rio está apto a receber os jogos Olímpicos (santo absurdo!). Mas Serra é austero, é preto no branco, low profile . Não é a cara do Brasil.

Quais podem ser as consequências disso? Se não for bem, Serra ficará apenas um mandato. Para dar lugar a quem? Lula, novamente, mais messiânico do que nunca, voltando nos braços do povo. Uma espécie de “Second Come”.

Governando durante o período da Copa e das Olimpíadas, é razoável pensar que Lula poderia se tornar um dos 3 homens mais influentes do planeta. Obviamente, os tucanos não querem permitir tal façanha. Após 8 anos longe do Planalto, querem garantir, no mínimo, mais 8 anos de hegemonia.

Talvez essa seja a única incógnita a ser resolvida nos próximos anos – se Serra ficará um ou dois mandatos. O resto do jogo já está combinado por todas as partes envolvidas. Isso se chama agenda política. São cartas marcadas, favas contadas. O PT sabe, o PSDB sabe, a imprensa sabe. E, agora, você também já sabe.